domingo, 25 de junho de 2017

Digestão Em Montmartre

Tocam os sinos na Sacré Coeur e os meus sucos gástricos
Começam a dissolver os mexilhões que empurrei com pão e cerveja,
Tocam os sinos para o início da digestão, a única celebração interior
Realmente sagrada, em que a nossa vida se prolonga em comunhão
Com os pedaços de pão que serão glicose nas minhas pernas
Enquanto desço de regresso até Clichy, passam-me pelo colesterol
Os dias tranquilos de Henry Miller e todas as vidas que poderia ter tido,
Fosse a digestão outra, os mexilhões outros, outro o pão que o diabo amassou.

Montmartre


16.06.2017

João Bosco da Silva
Réquiem para Jim e Arthur

Tão pouco de ti na tua eternidade de pedra, entre ruínas de túmulos gastos
Pela fome dos vivos pela morte, querem tocar-te, fazê-la sorrir,
Brincar aos imortais, mas tão pouco de ti entre mausoléus de desconhecidos,
Whisky quente, flores murchas, encravado numa cidade que não te deu tempo,
A tua alma tão longe e o teu corpo regressando aos poucos às areias quentes
De Venice Beach, é um erro tentar encontrar alguém num cemitério,
A sua presença ecoa nos lugares que tocou de carne quente e loucura em riste,
Como se encontra Rimbaud mais vivo nos olhos frescos de uma francesa
À entrada de uma esplanada e que aponta para o teu peito e diz,
Monsieur, Rimbaud, com uma voz adocicada pelos cigarros
E um fascínio quase infantil, como uma criança a apontar para um balão
Perdido no céu, onde aí sim, quando se apaga o dia, todos moram de verdade.

21.06.2017

Turku


João Bosco da Silva