sábado, 2 de julho de 2011


Conversa No Trabalho


Falam fascinados da sua casa nova, o armário que tem três prateleiras e a

Primeira é para escorrer a loiça, o sofá azul e a inesquecível visita à loja de móveis,

Com design sueco e fabricados na China ou em Portugal, onde nascem desejos de

Mais cadeiras (sempre vazias), mais almofadas (que serão só para estar e ocupar espaço),

As janelas, quantas são e a luz que deixam entrar, falam com uma excitação infantil,

Quase me assustam, mas fico na mesma (não me movo por dentro), a olhar para os seus

Gestos exagerados sobre quadrados, acenando que sim com a cabeça como quem ouve e

Compreende, mas não, não compreendo a excitação deles e eles nunca compreenderão

O meu fascínio por outras inutilidades eternas, que me pertencem, mesmo que não as

Possua, mas não hesitam em chamar-me de poeta ou maluco, quando lhes falo do

Aroma delicioso a verde quente das manhãs de Julho(antes de começarem os incêndios),

Ou quando gesticulo como quem pinta numa tela gigantesca com os dedos, apontando o

Crepúsculo pintado a cor-de-rosa, púrpura, cor de laranja e felicidade melancólica de mais um

Dia para mais um dia, ou quando conto como é aquela festa no Inverno com uma fogueira

Enorme e o ar cheio de ancestralidade e paganismo inocente, ou quando lhes explico

Tudo o que aconteceu antes do fumeiro na mesa e me olham chocados, com olhos enjoados

Enquanto os meus brilham com o sangue ainda quente, sem gota do sadismo que eles lêem.

Falam fascinados do seu mundo quadrado, mas eu não consigo vê-lo de outra forma que não

A dele e pergunto-me enquanto falam: anda a gente a trabalhar para encher a vida de vazios?



02.06.2011



Tampere



João Bosco da Silva